Após viver alguns anos fora do Brasil, um autor retorna ao lar para ajudar sua mãe a cuidar do pai, que recentemente passou a se comportar de forma estranha e planeja matar o atual presidente chego ao poder por meio de um golpe de Estado.
Meu Velho Guerrilheiro é o novo romance do pernambucano Álvaro Filho, lançado em 2018 pela editora Jaguatirica. A obra narra a construção das memórias de um filho em relação ao seu pai que, tendo vivido a repressão da Ditadura Militar, torna-se obcecado pela ideia de matar Michel Temer após a queda do governo Dilma em 2016.
Um quebra cabeças de estilhaços de memórias
O livro narrado em primeira pessoa conta as impressões do personagem-narrador sobre seu pai, construindo a partir de memórias que viveu e histórias que ouviu uma imagem de quem seria aquele homem. O autor consegue momentos bastante belos a partir dessa proposta, algo potencializado por uma escrita de frases curtas e repetições sonoras, que em muitos pontos flerta com o texto poético, fluxos de pensamento ou até mesmo de delírio.
Enquanto conhecemos melhor o Velho Guerrilheiro do título, também passamos a conhecer melhor o narrador, herdeiro da cultura familiar de seus pais e avôs, e consequentemente fruto desses elementos. Pouco a pouco ele vai entendendo o peso do passado na construção de alguém como indivíduo e o quanto a hereditariedade pode muitas vezes fazer as vezes de destino inescapável.
Quando a repetição se torna repetitiva
Confesso que não estou familiarizado com a obra de Álvaro Filho, por isso fico sem saber se algumas escolhas partiram do que se entendeu adequado para este romance, ou se partiram do estilo pessoal do autor.
O uso de repetições estratégicas de palavras é utilizado frequentemente para dar sonoridade e ritmo à narrativa, ao mesmo tempo em que o recurso enfatiza alguns temas centrais de cada cena, reforçando os vínculos entre as ideias que formatam a visão do mundo do protagonista. O bom uso desse recurso foi um dos responsáveis por alguns dos momentos mais belos do texto, mas o uso excessivo torna vários trechos cansativos e tira um pouco do impacto das partes em que funciona.
O problema é acentuado cada vez que isto também gera a sensação de estar relendo algo que já fora recentemente lido, com parágrafos reproduzidos com apenas algumas poucas trocas de palavras. Se por um lado pode-se argumentar que a temática da importância da memória se reforça com esse recurso, raramente acrescenta algo ao que está sendo narrado.
O inevitável comentário político
A obra tem um claro viés político, e se o texto de Meu Velho Guerrilheiro não dá nome aos bois, qualquer entrevista com Álvaro Filho deixa claro que a narrativa entende o governo Temer pós-Impeachment, entre 2015 e 2018, como fruto de Golpe. Obviamente, o grau de concordância do leitor com a visão de mundo do autor influenciará nas impressões finais do livro.
Apesar disso, a construção da imagem do pai do narrador a partir de relatos e impressões do filho, frente ao medo de ver esse mesmo pai ser perdido pelo fantasma da doença mental, cria uma obra com alguns trechos inspirados e uma carga emocional que frequentemente se mostra sincera.
Curto e de leitura rápida, Meu Velho Guerrilheiro traz elementos emocionais interessantes diluídos em discussões políticas que não são desenvolvidas. Apesar de alguns momentos duvidosos, é uma leitura que tem seus pontos fortes e tende a encontrar seu público.